sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Masculinidade e homossexualidade...

Existe nas sociedades em geral uma visão bastante clara do que é próprio do homem e do que é próprio da mulher. Graças aos estudos de antropologia, sabe-se hoje que esse jeito de ser homem e de ser mulher varia de uma sociedade para outra, o que mostra que não é inato ou genético.

A educação começa desde o nascimento, quando se atribui a uma criança um dos dois sexos, masculino ou feminino, com base nos genitais dela. A partir daí, toda a educação é feita em função dessa atribuição, ou seja, a criança aprende o que se espera dela.

Isso não significa que as pessoas em geral tenham consciência do que estão fazendo, pois foram educadas da mesma forma: um olhar de aprovação ou desaprovação diante de um comportamento, um sorriso ou uma cara fechada, um jeito especial de falar... Há estudos que mostram que, nos berçários das maternidades, as enfermeiras falam com os bebês de forma diferente: com os de sexo feminino, a fala é mais infantilizada, em geral, do que com os do sexo masculino.

Na nossa sociedade, essa visão do que é adequado a cada sexo pode ser percebida nas propagandas e nas novelas em geral. Nas propagandas, tudo o que é de casa é voltado para a mulher: fogão, geladeira, margarina... Nas novelas, as mulheres ou são donas de casa ou exercem cargos subalternos. Quando exercem cargo importante, colocam tudo em risco em nome de um amor.
O que tem tudo isso a ver com masculinidade e homossexualidade?
Embora a homossexualidade seja uma das formas de se viver a sexualidade e, de uma forma ou de outra, manifeste-se em diferentes sociedades, em diferentes momentos, ainda é um tema considerado tabu. Na televisão, por exemplo, pessoas homossexuais são apresentadas em programas de humor, como homens e mulheres inadequados, agindo de forma bruta, agressiva, no caso delas, ou de forma amaneirada, no caso deles.

Nas raras vezes em que se tentou trazer homossexuais, homens ou mulheres, como pessoas comuns, que trabalham, estudam, exercem seus diferentes deveres e direitos cidadãos, houve manifestação contrária do público, com uma conseqüente mudança nos rumos da novela. Ou seja, aquele que é considerado diferente da norma ainda só pode ser aceito como caricatura, mas não como parte integrante da sociedade.

Recentemente, numa pesquisa com adolescentes, para compreender como meninos e meninas, estudantes do ensino médio, compreendiam o que é ser homem e o que é ser mulher, os dados confirmaram o que autores(as) consagrados(as) já tinham encontrado: ser homem é não ser mulher e nem ser homossexual (Vera Vaccari, FSP/USP). Ou seja, para esses adolescentes, o homem, para mostrar que é “homem”, tem de ter um comportamento diferente daquele da mulher e do homossexual. Ou seja, o rapaz adolescente precisa constantemente provar de alguma forma sua heterossexualidade, o que muitas vezes contribui para que ele se demonstre intolerante quanto a pessoas que tenham um comportamento diferente do socialmente estabelecido. Numa oficina com adolescentes, há poucos meses, um rapaz disse (e foi apoiado pela maioria) que não concordava com o que eu dizia e que um jeito de lidar com homossexuais era espanca-los.

No consultório, vive-se o outro lado, de grande sofrimento: o do rapaz homossexual perseguido pelo preconceito, que lhe veda acesso a emprego ou a promoção, ou daquele que tem medo de seus desejos. Muitas vezes, esse rapaz pode viver esse temor como uma grande aversão a homossexuais, seja aos que trabalham com ele, ou que ele encontra no cotidiano, seja aos tipos apresentados na televisão.
Como resolver?
A discussão sobre hetero ou homossexualidade passa pela discussão sobre cidadania, sobre o direito de cada cidadão ou cidadã desenvolver suas potencialidades. Assim, falar em homossexualidade ou heterossexualidade significa também falar sobre diferentes formas de se ser homem ou mulher.

Sabe-se que mudanças não acontecem da noite para o dia. A repressão, pura e simples, não resolve o problema, embora possa evitar perseguições ao grupo discriminado, ao menos as mais aparentes. O caminho é a transformação, oferecendo às crianças e adolescentes uma educação em que aprendam a reconhecer que defender o direito do outro é defender seu próprio direito. As escolas têm importante papel nesse contexto. A educação sexual escolar, com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais, do ministério da educação, aborda diferentes temas sobre a sexualidade. Mas não aborda como, antes de mais nada, a educação sexual deve envolver pais/mães e a todos os educadores e educadoras responsáveis pelo projeto pedagógico, ou seja, todas as pessoas que atuam na escola. Caso contrário, corre-se o risco de se ver que nada é feito ou que a educação sexual ocorra num contexto preconceituoso. Por exemplo, não é incomum que a educação sexual escolar seja reduzida a uma série de palestras, feita por especialistas, com objetivos definidos, como “diminuir o número de meninas grávidas”. Dessa forma, nada se modifica e os membros da comunidade escolar como um todo não se vêem diante da situação de ter de enfrentar os próprios preconceitos.

Embora possa parecer utópico, é questionando mitos e tabus, estabelecendo e garantindo o gozo de direitos, sejam eles humanos, civis, políticos ou sexuais, a todos os membros da sociedade, de acordo com a faixa etária, é que podemos pensar em vencer não só a homofobia, mas também todos os demais preconceitos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário